sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Equilibrado entre caixotes, Waldir salvou o que pôde

Mariana Vita

Técnico em eletrônica no Tribunal de Justiça do Estado, Waldir Costa estava na casa de sua noiva em Icaraí quando a chuva começou. Até aí não parecia ser nada sério, mesmo assim ele achou mais seguro voltar para casa, um sobrado em cima do bar de seu pai, em São Gonçalo. Escolheu o momento em que a chuva diminuiu e um ônibus que o levasse por um caminho com menos alagamentos, já estava acostumado com as enchentes.

Quando chegou em casa, encontrou a calçada alagada, como de costume nos dias chuvosos em sua rua. Na manhã seguinte já não pôde ir ao trabalho: o bar estava com água até a altura dos joelhos. “Era impossível fazer qualquer coisa para tentar impedir que a água entrasse”. Na rua, árvores caíram e seus troncos eram levados pela corrente. O portão da casa dos vizinhos foi derrubado, alguns muros foram ao chão, inclusive o do condomínio onde morava sua irmã.

Nos Prazeres, Cuíca resiste. Com serenidade e firmeza

Felipe Pontes Teixeira

A água escorre livremente de uma mangueira durante toda a manhã do domingo de céu azul e se infiltra na grande língua de terra que corta o emaranhado de concreto ao meio. Apesar de asfaltado, o chão permanece impregnado pela cor da lama. Um homem lava sem pressa, com a ajuda do filho, duas Kombis estacionadas logo abaixo de um muro de contenção. Enquanto isso, funcionários da Oi restabelecem uma linha telefônica, dependurados num poste. A menos de 10 metros de distância, faz exatamente 47 dias, um deslizamento de terra matou 31 moradores no Morro dos Prazeres, favela de Santa Teresa.

A solidariedade da professora vizinha ao Morro do Beltrão

Camille Grandin

A professora Marcela Fogagnoli, de 25 anos, moradora do bairro Santa Rosa, em Niterói, teve sua rotina alterada no último dia 5 de abril devido às fortes chuvas que caíram sobre o estado do Rio. Durante a madrugada, o Morro do Beltrão, na sua rua, desabou, deixando vários conhecidos seus desabrigados.

Ao acordar, por volta das 7h da manhã, Marcela se deparou com um intenso movimento e com inúmeras casas destruídas. Sua primeira reação foi de pânico, depois de comoção. “Minha primeira atitude foi oferecer minha casa aos parentes dos desaparecidos, caso precisassem comer, tomar banho, descansar, enfim. Eu sentia que precisava ajudar de alguma maneira. Não só eu, mas muitos moradores subiram o morro para prestar socorro às vítimas”, contou.

“Onde nos botarem, tá bom”

Ana Carolina Ferreira Martins

O casal José Soares Lino, de 56 anos, e Maria da Conceição Oliveira, de 60, aceitou a contragosto falar da tragédia vivida no dia 6 de abril. Cansados do insistente assédio dos repórteres durante tantos dias, os dois se mostraram irritados no início. Mas, aos poucos, a conversa foi se desenvolvendo.

Dona Maria demonstra interesse, apesar da precária situação de saúde em que se encontra. Sentada em uma cadeira de rodas por causa de um acidente vascular cerebral três meses antes do desastre no morro, com os movimentos bastante prejudicados, ela acompanha atentamente a fala do marido sobre o dia da tragédia.

José conta que, como sua casa estava em obras, ele e a esposa estavam passando uns dias numa outra residência, onde moraram anos atrás. Dava o jantar à esposa quando as luzes se apagaram. Logo vieram dois estrondos fortes e muita lama.

A ação de um anjo da guarda

Priscilla Hoelz Pacheco

Com os olhos mareados, o pedreiro Sebastião Nascimento mostra as últimas peças de roupa que sobraram de tudo que tinha antes de a chuva “carregar tudo embora”. Mas não se deixa abater. Logo põe um sorriso no rosto e exibe com orgulho as filhas, a mulher, Marta, e a patroa dela, Lúcia – que a família considera seu “anjo da guarda”.

O pesadelo começou na madrugada de 6 de abril, quando Sebastião soube, pelo telefonema de uma vizinha, do desabamento de sua casa. Ele e a família estavam na comemoração do aniversário da irmã de Marta, no Cubango, quando receberam a notícia de que a chuva havia destruído boa parte do Morro do Beltrão, em Santa Rosa. Sebastião disse que achou, no início, que o telefonema fosse uma brincadeira de mau gosto. Levou um choque quando chegou ao morro e viu o que tinha acontecido com a casa em que morava há três anos com a família.