sábado, 16 de fevereiro de 2013


Luciano Ratamero, ex-aluno de Jornalismo da UFF, apresentou Trabalho de Conclusão de Curso sobre a tragédia das chuvas 

Por Alan Pestre

As chuvas que devastaram diversas áreas da região serrana do Rio de Janeiro, em janeiro de 2011, foram tema do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), em Jornalismo, de Luciano Ratamero, defendido no final do primeiro semestre de 2012. Natural de Nova Friburgo, onde morou até seu ingresso na UFF, em 2008, ele estava em São Pedro da Serra, distrito friburguense, nos dias 11 e 12 de janeiro, quando começaram as tempestades. Considerada a maior catástrofe climática da história do país, as chuvas causaram mais de 900 mortes. Apenas em Friburgo, foram registradas 451 vítimas e mais de uma centena de desaparecidos.

São Pedro da Serra não sofreu com deslizamentos de terra ou grandes enchentes, porém a única ligação com a cidade ficou obstruída e o distrito ficou sem água, luz e telefone. “Estava comemorando um ano de namoro. Naquele momento não tinha a menor noção da proporção da tragédia, apenas escutava boatos. Recordo que havia saído para jantar com minha namorada, quando percebi o início da tempestade. Voltei para a pousada onde me hospedava, impressionado com a força da chuva, que derrubou uma árvore a pouco mais de dez metros de mim”, relatou. “Apenas no dia seguinte, ainda sem luz, água e telefone, deduzi que a situação era muito mais grave do que havia imaginado. Decidi voltar para o centro da cidade para visitar meus pais, mesmo que fosse necessário andar os 35 quilômetros que nos separavam. Quando consegui encontrá-los, soube que nossa casa havia sido condenada.”

Seus pais foram resgatados de bote, em Córrego Dantas, um dos mais afetados. “O cenário era indescritível. Todas as memórias que tinha da cidade, em poucos minutos se tornaram ultrapassadas, e a nova realidade começou a tomar seu lugar. O lugar era um misto de lama, escombros e pedras”, recordou. “E as mudanças, para pior, continuaram. Nos meses seguintes, houve um êxodo absurdo. Uma em cada duas lojas está procurando funcionários, e o turismo não é mais o mesmo.” 

Foto denúncia 

Desde então, Ratamero decidiu que Nova Friburgo seria o tema do seu TCC. A escolha por um trabalho fotográfico foi consequência da familiaridade com o formato e pelos trabalhos realizados anteriormente durante o curso. E a decisão por fotos denúncias foi “culpa” dos políticos. “Ouvia falar que nada tinha sido feito, mas não tinha a noção exata, porque estava morando em Niterói.” Visitando a cidade, já pensando em como fazer o trabalho, percebeu o total descaso das autoridades. “Um ano depois, praticamente nada foi feito. Em Córrego Dantas, por exemplo, melhoraram a questão do assoreamento do rio, mas nenhuma obra de contenção foi iniciada. Muitas pessoas continuam morando em casas condenadas. Meus pais não moram mais lá, construíram uma casa no terreno dos meus avós, num bairro bem mais seguro. Eles já foram procurados por pessoas querendo alugar a nossa antiga casa.” 

No início, a ideia era fazer um ensaio fotográfico dos lugares mais afetados, mas esse trabalho só teria impacto para os friburguenses. Pessoas que não conhecem a região não teriam noção de como estavam esses lugares logo após a tragédia e do pouco que foi realizado. Daí, o antes e depois vieram como solução para obter o resultado esperado. “A forma mais comum, típica do jornalismo impresso, é a do paralelismo entre uma foto e outra, lado a lado. Esse formato, porém, não abriria espaço para maneiras diferenciadas de explorar as novas mídias, já que elas possibilitam muito mais.” A solução de como mostrar o antes e o depois em uma única foto estática foi inspirada no ensaio “Altneuland”, do fotógrafo israelense Amit Sha'al.  

Para recuperar as fotos da tragédia, Ratamero fez visitas ao acervo do jornal A Voz da Serra e da Associação de Moradores de Córrego Dantas, já que nem mesmo o jornal local conseguiu cobrir o bairro nos dias da catástrofe. “Preferi deixar de fora os grandes jornais devido à burocracia envolvida no processo de liberação das fotos e pelo fato de que, neste caso, um olhar local tende a ser mais focado no que foi importante, ao contrário do que ocorre numa grande empresa com olhar mais distante.” 

Primeiramente, Ratamero escolheu 1.807 fotos. Destas, selecionou 72 e visitou os locais onde foram feitas. Em 42 imagens, fez a foto do “depois”, sempre buscando o mesmo ângulo e enquadramento da foto de arquivo. Quatro foram descartadas. Nas 38 fotos restantes escolheu quais as áreas seriam representadas por fotos antigas e quais deveriam receber um novo registro. “Fiz as visitas entre os dias 10 e 20 de janeiro de 2012, exatamente um ano após a tragédia, para que as imagens produzidas fossem fiéis ao intuito do ensaio. Fiz ao todo quatro visitas a oito bairros para conseguir capturar as novas imagens. Em quatro locais, fui abordado por moradores e trabalhadores, e todos se demonstraram indignados com a situação da cidade após um ano do ocorrido.” 

A pós-produção foi a etapa mais trabalhosa. “O primeiro passo foi abrir as fotografias antigas no Photoshop e selecionar as regiões ressaltadas durante o levantamento anterior. Depois adequei as camadas editadas à nova fotografia, mesclando as imagens. Por fim, corrigi as cores e os contrastes da imagem e apliquei uma camada de saturação na camada da imagem de arquivo. A edição das fotos foi por tentativa e erro, mais transpiração do que inspiração.” 

O ensaio de Luciano Ratamero recebeu elogios dos professores da banca, Rômulo Correa, seu orientador, Dante Gastaldoni e Larissa Morais, além dos significativo numero de acessos e compartilhamentos nas redes sociais. O jornal A Voz da Serra dedicou um caderno especial ao trabalho do ex-aluno da UFF. “Meu objetivo principal era que os moradores de Friburgo vissem. Todos gostaram, minha mãe chorou ao ver pela primeira vez. Eu também gostei muito, faria tudo de novo. Eu não tinha como abordar esse tema sem ser subjetivo. Quem sabe, futuramente, farei uma grande reportagem sobre o assunto.”

O trabalho completo pode ser visto na galeria de Luciano Ratamero.

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