segunda-feira, 23 de novembro de 2015

O Estado penal e o sistema de encarceramento em massa

Por Victoria Macdonogh

Os Estados Unidos ocupam o primeiro lugar no ranking de encarceramento mundial. Seguindo a lógica neoliberal, o governo estadunidense reduziu os gastos com programas sociais e alterou as regras de contratação e demissão, flexibilizando o trabalho assalariado e gerando um sistema de insegurança social. A atrofia do Estado social alimenta a hipertrofia do Estado penal: os cortes nos programas sociais e a flexibilização dos empregos empurram milhões de pessoas para uma situação de pobreza em massa, e aumentam as desigualdades já existentes e latentes na sociedade americana, alimentando a segregação e a criminalidade.
A mudança do Estado social para o Estado penal também acompanha a mudança do conceito de norma para o de risco. A prisão, que antes tinha como função recuperar o desviante, passa a servir como contenção de riscos. Há um abandono do ideal de reabilitação, e o objetivo da prisão deixa de ser a prevenção do crime ou o tratamento dos presos de forma a reabilitá-los e reinseri-los em sociedade. A cadeia passa a servir como forma de “isolar grupos considerados perigosos e neutralizar seus membros mais disruptivos”. Assim, deixa-se de pensar em mecanismos de reabilitação, desprisionalização e justiça juvenil não encarceradora. Como explica Marta Rodriguez de Assis Machado, em um artigo publicado no Le Monde Diplomatique Brasil, citando um estudo de Jonathan Simon, professor de Berkeley:

“ Na nova ordem do Estado penal, impera a lógica do Estado mínimo, da proteção mínima contra riscos econômicos e sociais, da responsabilização individual. O direito penal é quele que, diante de um problema social complexo, que resulta da interação de muitos fatores - muitas vezes históricos ou sistêmicos -, produz sempre uma resposta baseada na responsabilidade individual”

Esta política de encarceramento em massa tem como principais vítimas os jovens pobres e em sua maioria negros que são usuários de drogas ou praticam pequenos furtos. Ao contrário do que é frequentemente noticiado na mídia, as prisões estão repletas não de criminosos violentos, mas sim de pequenos delinquentes e toxicômanos. A taxa de encarceramento por tráfico no Brasil cresceu 344,8% desde 2005. A política de guerra às drogas é uma das principais causas do crescimento da população carcerária, e sabe-se já há um tempo que é uma política que não dá resultados: não conseguiu diminuir o consumo, contribuiu para o aumento da violência e da circulação de armas ilegais, fortaleceu o crime organizado e resultou em um encarceramento em massa. O custo social é enorme; o Brasil ocupa o quarto lugar no ranking de países que mais encarceram no mundo, e o perfil da população selecionada pelo sistema prisional é bem específico - as maiores vítimas deste sistema são os jovens (cerca de 74% dos presos no país têm menos de 35 anos) pobres e negros (67%). Quase 70% dos presos não concluíram o ensino fundamental.

Gráfico mostra que o Brasil é o país com maior crescimento na taxa de encarceramento desde nos últimos anos (Gráfico: Conectas Direitos Humanos)