sábado, 21 de agosto de 2010

Moradores do Morro do Urubu ainda sofrem com as consequências das chuvas de abril

Texto e fotos: Rafaella Barros

O Morro do Urubu, ainda com o entulho das casas
demolidas após o temporal 
No Morro do Urubu, em Pilares, os deslizamentos que ocorreram em abril deste ano trouxeram mudanças para alguns moradores, mas também a sensação de abandono do governo para outros, apesar de todas as promessas feitas na época dos desastres.

O líder comunitário Anderson Ribeiro e a representante da Associação de Mulheres e Amigos do Morro do Urubu (Amamu), Sônia Regina, relataram o que aconteceu naqueles dias de chuvas torrenciais e o cenário posterior a eles.


Na comunidade não houve mortes em decorrência dos deslizamentos. “Batemos de porta em porta pedindo para sair, por isso ninguém morreu”, disse Sônia. Mesmo assim, muitos moradores tiveram que sair às pressas, com a roupa do corpo. Alguns chegaram a ser soterrados. Foram salvos pelos bombeiros.

Aproximadamente quinze casas caíram no Urubu ou foram invadidas por terra e pedras. Algumas famílias ficaram alojadas durante quase duas semanas no Centro de Comércio e Indústria de Pilares (CCIP). Segundo Anderson, a ajuda dos empresários e comerciantes da região foi fundamental para os desabrigados.

À semelhança do que aconteceu nos morros dos Prazeres  e Fogueteiro, na comunidade do Urubu foram distribuídos 537 autos de interdição pela Defesa Civil. Desse total de famílias, 299 foram transferidas para o conjunto habitacional Vivendas do Ipê Amarelo, em Realengo. A escolha de quem iria para o condomínio foi feita com prioridade para os casos mais críticos, como as famílias cujas casas caíram ou estavam rachadas. Segundo os integrantes da Associação, a maioria não queria estar lá. “Tinha gente que não queria sair daqui. Ficou um pedacinho de vida, né”, comentou Sônia.

Críticas à imprensa e ao governo 

Sônia e Anderson relataram o que viram nos dias seguintes à tragédia no morro sobre a cobertura da imprensa e fizeram um desabafo. “A gente viu que tinha a imprensa a favor e a que fazia oposição. Teve vez do prefeito entrar numa casa e falar assim, ‘o repórter do jornal tal entra comigo’”, reclamou Sônia. “E os jornalistas que eram contra procuravam mostrar os moradores mais revoltados”, completou Anderson.

Como costuma acontecer, passado o primeiro impacto, o fato deixa de ser notícia e a vida segue precária. “Naquele momento, todo mundo veio, teve aquele ‘boom’, todo o aparato da prefeitura. Mas não está uma coisa contínua, que eles continuem aqui para ver o que está acontecendo”, argumentou Sônia.

Sem prazos ou previsões 

As mais de duzentas famílias que não foram para o conjunto habitacional acabaram voltando para suas casas, mesmo interditadas e muito precárias – como no barraco ao lado, em terreno onde um rapaz ficou soterrado num deslizamento –, porque não têm para onde ir. “O CCIP não tinha como continuar com as duzentas e poucas famílias lá. Acho que isso é papel da prefeitura”, disse Anderson.

Quem ficou não convive apenas com o constante risco de deslizamento, mas com a sujeira e a falta de manutenção de serviços básicos no morro. A prefeitura derrubou diversas casas na comunidade, mas deixou o entulho por lá, ameaçando desmoronar e atingir outras casas. “Queremos que tirem o entulho e façam obras de contenção. Se existe possibilidade de obras, é isso que a gente quer”, declarou Anderson.

Segundo o líder comunitário, desde as chuvas de abril, nenhuma contenção ficou pronta. Há obras paradas na comunidade e nenhuma resposta da prefeitura. Além disso, poucos serviços básicos foram restabelecidos. Aos moradores que antes tinham telefone e depois do temporal ficaram sem linha, a Oi alega que não tem mais o serviço na região. Para ter luz, “cada um tá dando seu jeito’, disse Sônia, já que a Light ainda não consertou a maioria dos trinta postes que caíram na comunidade, mesmo após o envio de um ofício. “Eles exigem o ofício, mas não dão resposta”, desabafou Anderson.

Anderson mostra a escada rachada, em área que
recebeu obras do Favela-Bairro
A insatisfação é compreensível ao se fazer uma breve caminhada pelas ruas do Morro do Urubu. A quantidade de casas que foram derrubadas e o lixo de barro, concreto e tijolos impressionam. Embora na comunidade tenha sido contemplada com o Favela-Bairro, a maioria das ruelas cimentadas ficaram rachadas ou muito danificadas pelas chuvas, a ponto de ser quase impossível caminhar por elas.




Invasão do inabitável 


Ao contrário do que foi noticiado, as famílias que não foram contempladas com os apartamentos do condomínio em Realengo não receberam o aluguel social. Segundo Sônia e Anderson, houve uma reunião no dia 14 de julho com a Defensoria Pública, que exigirá uma resposta da prefeitura, já que esta não apresenta nenhuma previsão para os moradores. “O [subprefeito] André Santos disse que tiraria todos da Silva Feijó e daria aluguel social, mas até agora nada. Nós estamos correndo atrás. Não tá fácil, não”, disse Sônia, referindo-se à rua onde ela mesma mora, uma das principais do morro, onde todas as casas estão interditadas e condenadas pela Defesa Civil, mas continuam habitadas.

Casa habitada, apesar de parcialmente destruída
O desespero de quem não tem para onde ir pode também ser constatado por uma prática cada vez mais comum no morro: a invasão das casas abandonadas, interditadas, em áreas com evidente risco de deslizamento. Durante o percurso no morro, Anderson mostrou um caso desses. Ao observar que havia roupas no varal e sinais de ocupação numa dessas casas, ele chamou e foi atendido por uma jovem.

“Oi, bom dia. Você está morando aqui?”

“Sim”, respondeu a moça.

“Mas vocês sabem que não podem ficar aqui, não. Essa casa está interditada”.

“Eu sei, nós vamos ‘se’ mudar amanhã”, retrucou a jovem.

A situação já havia, de certa forma, sido prevista pela prefeitura. Em alguns casos, derrubar totalmente as casas provocaria mais riscos de desmoronamento. Assim, essas casas foram apenas descaracterizadas, ficando sem portas ou janelas, para desencorajar a reocupação ou a invasão.

Casa sem janela, para evitar a reocupação
Politicamente incorretos? 

No passeio por dentro da comunidade é possível observar dezenas de placas de candidatos a deputado estadual e federal afixadas nos muros das casas ou em postes, numa proporção quase de um para um.

Anderson discorda de que esse seja o melhor caminho, mas reconhece o apoio que a comunidade costuma dar para os que ajudam ou simplesmente escutam suas queixas: “Ninguém consegue nada sozinho. O povo aqui é muito desunido. Quero algo coletivo. A gente costuma pedir voto para quem nos ajuda”.

Mudando de vida 

“Mudou muito. É outro lar, outro ambiente”. Foi assim que a dona de casa Vivian Duarte, de 29 anos, resumiu o significado de sua mudança para o condomínio Vivendas do Ipê Amarelo, em Realengo, nova moradia para outras 298 famílias que tiveram suas casas destruídas ou interditadas no Morro do Urubu. As unidades foram entregues a esses moradores gratuitamente, pois a prefeitura assumiu o financiamento com o qual teriam que arcar. Ninguém ainda possui a escritura dos apartamentos, apenas um termo de garantia de que, em 10 anos, a escritura será entregue.

Vivian e o marido, o pedreiro Luciano Gomes, de 47 anos, estão no novo apartamento desde o dia 29 de abril. A casa onde moravam no morro foi atingida por uma pedra que rolou e derrubou a parede da cozinha. O casal ainda ficou alguns dias na casa de uma irmã de Luciano, até conseguir o apartamento no condomínio.

Vivian relembrou o dia em que perdeu a geladeira e o fogão e teve que deixar a casa às pressas, para evitar o pior. “A Sônia e o Anderson subiram o morro e começaram a alertar o pessoal a ir para o abrigo. Se acontecesse alguma coisa, seria uma tragédia”.

A dona de casa contou que praticamente todos os moradores transferidos para o conjunto aprovam a nova moradia e tanto ela como os que ela conhece não têm nada do que reclamar. “Sempre tem uma minoria que não gosta. Mas nem Jesus Cristo agradou a todo mundo, né?”.

O condomínio embandeirado para a festa
O Vivendas do Ipê Amarelo tem 15 blocos de apartamentos de dois quartos, sala, cozinha e banheiro. Como os prédios de quatro andares não possuem elevador, foi construída uma unidade térrea especialmente para os mais idosos. A relação comunitária se mantém: pessoas jogam baralho entre um andar e outro, crianças brincam e jogam bola no pátio. No dia em que a reportagem foi feita, o condomínio estava enfeitado com bandeirolas para a festa julina, marcada para aquela noite.

Outra nítida diferença, perceptível assim que se chega ao condomínio, é o policiamento constante: uma viatura da polícia fica estacionada dia e noite na porta do conjunto. “Tudo isso se deve primeiramente a Deus. Depois à Amamu, que mais nos ajudou. Se não fosse por eles, nada disso teria acontecido”, disse Vivian.

A síndica do condomínio, Maria Inês de Oliveira, é outra que não economiza elogios à nova vida. Ela morava numa área de risco no Urubu e sua casa ficou completamente alagada. No quintal havia também outras casas, ocupadas por parentes. Com o marido, o lanterneiro Diomério Santos, Maria Inês mudou-se para o conjunto e a vida melhorou: “Mesmo que eu quisesse, não teria dinheiro para comprar um apartamento como esse. Mudou meu estilo de vida. Aqui é tudo positivo, só de eu poder dormir tranquila, sem a preocupação de uma pedra cair sobre a minha casa”.

Nem tudo são ipês 

A mudança, entretanto, significou o desemprego para quem morava próximo do local de trabalho e, agora, teria de arcar com as despesas de transporte, uma vez que os patrões não aceitaram pagar pelas passagens. Foi o que ocorreu com a própria síndica, que trabalhava como doméstica.

Segundo ela, alguns moradores estão passando sérias dificuldades para sobreviver. Os que faziam bicos, como reciclagem de lixo, não puderam continuar com essa atividade no conjunto habitacional. “Quem vivia de bico, aqui não pode mais fazer isso. Eles reclamam muito, sabe...”, disse Inês.

Questionada sobre como essas pessoas estão fazendo para sobreviver, ela contou que há uma associação de uma igreja próxima ao condomínio que está ajudando com cestas básicas. Inês também reclamou sobre os novos gastos que os moradores estão tendo e outros que ainda terão devido à mudança: “A conta de luz aqui é altíssima, devido ser sistema trifásico. Tem conta que tá vindo mais de cem reais! Têm pessoas aqui que não têm nada. Da onde que eles vão tirar dinheiro para pagar água e luz? Eles querem pagar, mas também querem trabalho!”

A reportagem tentou contato com a assessora de imprensa do subprefeito da zona norte, André Santos, mas não obteve resposta. Já a assessoria de imprensa da Light não soube informar se as providências na rede elétrica na comunidade serão tomadas.


Galeria:

Fotos Rafaella Barros

O acesso ao Morro do Urubu, onde se espalha o entulho das casas demolidas pela Prefeitura, e o condomínio em Realengo, para o qual parte das famílias foi transferida.

2 comentários:

Anônimo disse...

o que aconteceu no morro foi horrivel, mas no condominio nen tudo e flores, a luz e alta demais, as cestas basicas não são para todos,querem cobrar condominio e o pior quem não tem condições de viver aqui não pode nem vender para recomeçar, se andar por aqui verá que há familias que não tem como viver enquanto as casas segundo interditadas estão voltando a ser habitadas porque não foram destruidas, tem gente invadindo o que tantos suaram para construir, e em instantes perderam, muitos não para a tragedia para a conveniencia da prefeitura que falou em quebrar so que inves permitiu que fossem reabitadas sera que foi melhor para muitos que hoje não tem como arcar com as dividas do condominio, no modo de moradia trouxe
dignidade para muitos mas porque ter uma casa decente e não ter oque comer o como pagar suas contas, aqui estamos so, sem apoio da prefeitura ninguem nem aparece, o tal sub prefeito nem telefone atende, e o condominio esta precisando de respostas da prefeitura, tem muitas coisas acontecendo como telhados caindo, e ninguem nen mesmo o prefeito aparece cade as atoridades?

Anônimo disse...

Aqui no morro tambem a coisa não esta boa não as casas que estavam em `risco`que a prefeitura condenou e não derrubou estam habitadas por gentes que nem moravam aqui,traficantes guardam suas armas e dao as casas para seus protegidos ainda tem muita gente aqui pra sair ,e obras a fazer mas ninguem vem mas aqui nem prefeitura nem reportagem para fazer pos demolição e nem politicos estamos abandonados só DEUS mesmo para olhar por nós.

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