sábado, 31 de julho de 2010

Najup aponta interesses econômicos por trás da defesa das remoções

Por Rafaella Barros

Os interesses econômicos e a especulação imobiliária, acelerada pela contagem regressiva para a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016, estão na base da defesa das remoções de favelas, de acordo com os integrantes do Najup – Núcleo de Apoio Jurídico Popular, coordenado pelo ex-procurador Miguel Baldez. Reunido no dia 14 de junho, em sua sede, no Centro do Rio, o grupo debateu as melhores formas de continuar a agir em apoio às comunidades afetadas pelas chuvas do início de abril.

A reunião contou com a presença da defensora pública do Estado do Rio de Janeiro Maria Lúcia Pontes, do professor Taiguara Souza, do Ibmec e do Instituto de Defensores de Direitos Humanos, da psicóloga Elza Ibrahim, que durante anos trabalhou em manicômios judiciários, e de estudantes de direito.

Há três anos no Núcleo de Terras e Habitação da Defensoria, Maria Lúcia tem sido a principal referência no apoio às comunidades dos morros do Rio contra as remoções. Embora condene as declarações do prefeito, ela considera que a questão das remoções não deve ser personificada. “A defesa de remoções não é ‘do Eduardo Paes’, vem desde César Maia. Se fosse outro, não seria diferente”, disse ela.

Interesses econômicos, poder público e mídia

Segundo a defensora, os interesses econômicos por trás das remoções estão sendo administrados pela prefeitura. “É uma coisa muito sutil, as pessoas geralmente não conhecem o que está acontecendo. As chuvas permitiram que o prefeito colocasse esse projeto de remoção na mídia. Ele usou a grande mídia para apresentar o processo de remoção como uma coisa boa”, observou Maria Lúcia, argumentando que o público, desinformado, acaba apoiando o processo de remoção.

A Defensoria do Estado, que conta com quatro defensores, atende em média duzentas comunidades no Rio e reconhece que, de fato, existem comunidades sob risco iminente e desejam sair de onde estão. Entretanto, para Maria Lúcia, quando a saída dessas pessoas interessa, a prefeitura tenta dar um jeito de reassentá-las. Quando não, nada é feito em benefício dos moradores.

“Escutar o direito”

A grande inovação do Najup é fazer com que a comunidade “escute o direito”, termo que Maria Lúcia usou ao explicar como os moradores do morro recebem os defensores e como é a relação entre eles: “A gente recebe a comunidade e depois vai até lá”.

A atuação da Defensoria busca atender a todos os ameaçados de terem suas casas demolidas pelo governo. Impetra, nesses casos, uma ação civil pública, solicitando ao juiz tutela que alcance toda a população, em vez de nomear um por um. Todas as ações, entretanto, são feitas por meio de diálogos com a comunidade.

“Quando você resiste, você cria dificuldades para a prefeitura”, disse Maria Lúcia, que mostrou como o discurso da prefeitura de que as comunidades são irregulares leva à errônea conclusão de que os moradores não têm direito algum: “Eles ignoram o usucapião, básico do direito, porque se trata de uma comunidade pobre”.

A necessidade de mobilização

Na reunião também foi debatida a questão da mobilização das comunidades, que nem sempre têm o apoio das associações de moradores, pois esses representantes às vezes preferem se aliar ao governo. Nesses casos, a Defensoria precisa agir diretamente com os moradores que se sentem ameaçados pela remoção e pela demolição de suas residências. “O defensor tem que ser um espelho das necessidades dos seus atingidos”, disse Maria Lúcia. “Se a gente trabalhar com a ideia de que as favelas não têm direito à cidade, você trabalha com a ideia de legalidade da remoção. Se a gente não conseguir um grande movimento das comunidades contra esse processo, é difícil ir contra. Como discutir o direito à cidade dessas comunidades frente a interesses econômicos? É complicado”, completou a defensora.

“A política está por trás do direito e se sobrepõe a ele”, disse o professor Taiguara. Por isso, o ex-procurador Miguel Baldez apontou a mobilização popular como a única saída para os enfrentamentos dos moradores dos morros e que ultrapassa as vias políticas partidárias e os próprios meios jurídicos: “O caminho, para mim, é a organização do trabalhador. Tem um direito novo nascendo do povo, que não está na lei”.

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