quinta-feira, 3 de junho de 2010

Morro do Bumba, 35 anos

Por Luiz Edmundo de Castro


As fotos do lixão do morro do Bumba foram registradas nos anos de 1974 e 1975 como parte de uma reportagem (cerca de 300 fotos aproximadamente), para um audiovisual (projeção de fotos e trilha sonora sincronizadas) apresentado como trabalho final do Curso de Cinema da UFF, realizado por mim, fotografias, Carlos Aquino e Joubert de Assis, reportagens e os três editando e coordenando o trabalho final.


Nessa época minha dedicação profissional se voltava para o curta-documental, ponto forte de denúncia das diferenças sociais e uma forma de confrontar o período ditatorial neste pais.
Sombria e ingênua profecia, um amigo ambientalista batizou o trabalho de “SAMBAQUIS DO FUTURO”, pensando mais na descoberta, por gerações futuras, de todos os restos de uma civilização industrial ali depositados. No fundo o trabalho tinha em mente denunciar o lixo de uma sociedade consumista e de castas cuja base humana, sem poder aquisitivo e condições dignas de vida, isto é, o lixo humano, se encontrava com o lixo do consumo de suas classes “dominantes”.

Com a tragédia deste ano passei a pensar nas famílias que já ali montavam seus barracos precários, de papelão e restos de madeira, assim como nas crianças que então eu havia fotografado. Talvez muitas destas famílias lá tenham permanecido e ganho um “status” social de melhor condição urbana, mas sem realmente terem sido consideradas a fundo, assim como os estudos para a urbanização dessa área não o foram. As crianças das fotos, e isto coloco sem o apelo melodramático das reportagens de nossos canais de televisão, sejam, 35 anos depois, exatamente os moradores ali soterrados e seus filhos.

A profecia se realiza, pois sambaquis na verdade são os cemitérios de nossos índios, que depositavam, com o maior respeito, os restos de seus pares, muito diferente de nossa sociedade contemporânea que persiste em um sepultamento coletivo macabro de seus semelhantes de “menor valor” econômico e social, sem nenhum respeito pela vida e dignidade humanas.

* Luiz Edmundo é professor de fotografia do IACS/UFF

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